O santo, a princesa e o livro mágico

 

O santo, a princesa e o livro mágico

 
A região do Mezio é um lugar encantador, que se torna fascinante ao revelar os mistérios da região e do país.

Se este site evoca frequentemente uma era antiga e esquecida, a era cristã também nos fornece algumas histórias misteriosas.



Por exemplo, para a região, a estranha descoberta da sepultura de um santo.

Para o Mezio, a lenda de um palácio na montanha.

Finalmente, uma história para todo o Portugal, o aparecimento de um livro mágico.

A tumba de São Torquato


Como já mencionado noutros artigos, o rio Lima, que corre perto do Mezio, fascinou os romanos, para eles era o rio do esquecimento, o Lethe ou Oblivion.

Justificou a sua reputação de rio do esquecimento quando, séculos mais tarde, foi descoberto o túmulo esquecido de um santo.

Torquatus, um dos 'sete homens apostólicos', los sete varões apostólicos.

Um grupo de lendários missionários cristãos, os primeiros na Península Ibérica, por volta do século I.

Segundo os escritos, foram evangelizar o sul de Espanha, enviados para difundir a fé cristã pelos santos Pedro e Paulo, talvez de Roma.

Chegando perto de uma cidade no sul, perseguidos pelos pagãos, tiveram de fugir e atravessar uma ponte. A ponte desmorona e a multidão não os consegue apanhar.

Uma mulher nobre esconde-os, ajuda-os. Ela irá converter-se.


Torquatus é agora considerado o santo padroeiro de Guadix, no sul de Espanha, e o primeiro bispo dessa cidade.

Curiosamente, séculos após a sua morte, o seu sepulcro foi encontrado numa pequena igreja construída em sua honra no norte, perto de um rio, o Lima.

Actualmente, várias igrejas têm relíquias de São Torquatus.

Esta igreja não é provavelmente próxima do Mezio, mas o Lima atrai lendas, perto da sua margem encontra-se um pequeno mas parcialmente muito antigo mosteiro, o de Ermelo.

Que, claro, tem a sua própria lenda, sem relação com São Torquato, a de uma princesa.


O Mosteiro da Princesa


Segundo a lenda, por volta do ano 1000, o Rei de Leão concedeu à sua filha o direito de construir um .
E a promessa de que ela poderia possuir tudo o que viu do quarto da sua nova casa.

Por isso decidiu ir para a montanha mais alta da região, o Outeiro Maior.

Na subida final, ela parou perto de um lugar que se chamava Bouças Donas, em honra das senhoras que a acompanhavam.

Continuou até ao topo da montanha, onde ordenou que a construção fosse iniciada.

Durante este tempo ela visitou o rei, que lhe perguntou o que podia ver do seu quarto, e respondeu de Braga para o mar a norte.

O rei, sem saber que tal lugar existia, teve de retirar a sua promessa, uma vez que não podia dar metade do seu reino.

A princesa, ofendida, cancelou a construção e foi para o fundo do vale, num local muito isolado, fundar um mosteiro, o de Ermelo.

Diz-se que as fundações do pequeno palácio ainda hoje podem ser vistas no topo da montanha.


Este é um resumo de uma versão da lenda da fundação do mosteiro de Ermelo, encravado entre o rio Lima e o Monte Giao, perto do Mezio.

Este lugar tem um belo sítio,é preciso visitá-lo para descobrir realmente o mosteiro: basta clicar nesta imagem que vem do sítio AltoMinho.pt :



Bouça Donas é o nome de uma aldeia muito próxima do Mezio, na venerável freguesia de Cabana Maior.

Segundo a lenda, é uma aldeia com mil anos de idade.

Outeiro Maior é o nome mais antigo conhecido para as montanhas da Serra de Soajo.
O nome ainda hoje é usado, mas oficialmente refere-se a uma parte muito pequena da montanha, perto do cume, a Pedrada.




Como explica Fernando Cerqueira Barros em "A Construção do Território na Serra da Peneda", existe uma versão ligeiramente diferente da lenda, que provém da população local.

Esta versão explica que a construção vai parar porque viver no topo da montanha não será muito agradável, "os feijões não cozem nem como couves ganham cor".

É impossível saber quando começou a lenda local, uma vez que só foi transmitida oralmente. No entanto, é possível encontrar um vestígio literário já em 1700.

O padre António Carvalho da Costa, que viveu entre 1650 e 1715, deixou para trás várias obras, incluindo "Corografia portuguesa, e descripçam topografica do famoso reyno de Portugal...", em 1706:

"N'esta F., ao pé da serra de Outeiro Maior, está a aldeia

de Bouças Donas, nome que tomou das donas que acom-

panhavam a infanta, fundadora do mosteiro que está no

alto do monte, e que ali residiram em quanto se fez a obra".


Em relação à referida princesa Urraca, poderia ser Urraque de Zamora ou Urraque de León, da mesma 
família, com uma saga que também começa por volta do ano 1000.

Após a morte do seu pai, o rei, a primeira Urraca herda a cidade de Zamora, os seus irmãos e irmã o resto do reino de Leão. Todos eles vão para a guerra pelo controlo de todo o reino.

Ela é a aliada do seu irmão Alfonso, que ganhará esta guerra e se tornará o rei de Leão.


Urraque manterá o controlo da sua cidade até à sua morte numa idade avançada, num mosteiro em Zamora.

Alfonso, o novo rei, com a sua mulher Constança de Borgonha, terá seis filhos. Apenas uma sobrevive, a segunda princesa chamada Urraque, na fotografia deste artigo.

Ela tornar-se-ia rainha de Leão antes de ter de ir para a guerra com o seu segundo marido. Ela parece ter tido uma vida épica, tornando-se a primeira rainha reinante na Europa.

Se o seu primeiro casamento com Raymond de Borgonha foi uma forma de trazer os nobres franceses para a luta contra os mouros.
O seu segundo casamento rapidamente se tornou azedo, e foi ela quem pareceu tomar a iniciativa da separação, que terminou numa guerra sem vencedor.

Curiosamente, a Infanta Urraca é novamente mencionada mais tarde em Portugal ... num "livro mágico":

O Grande Livro de São Cipriano, o tesouro do feiticeiro


Diz-se que São Cipriano é um feiticeiro do terceiro século, um praticante de magia negra, que se converteu ao cristianismo depois de conhecer uma mulher chamada Justine.

Há alguns séculos, um livro começou a circular, supostamente escrito por Cipriano.

Claro que é uma falsificação, o equivalente às "fake news" de hoje. Mas o livro foi muito bem recebido em Portugal.

Aqui está a lenda de Cyprien e Justine, segundo a Wikipedia:

Quando jovem, Justine foi convertida ao ouvir o diácono Proctus proclamar o Evangelho todas asmanhãs.

Quanto a Cipriano, é mágico e feiticeiro, um conhecido ocultista do seu tempo, e autor de um livro sobre feitiçaria.
Ele tenta seduzir Justine, seja por sua própria conta ou a pedido de uma certa Aglaïdas.

Ele convoca um ou mais demónios para este fim, mas como Justine se protege fazendo o sinal da cruz, as forças demoníacas não conseguem. Pelo contrário, Justina é a que obtém a conversão de Cipriano.

Cipriano é convertido ao cristianismo e torna-se bispo, directamente ou depois de ter sido diácono e depois padre.
Justine e Cyprian foram martirizadas em 304.

Segundo a Wikipedia, O Grande Livro de São Cipriano ou o Tesouro do Feiticeiro refere-se a vários grimoires dos séculos 17, 18, 19, populares no mundo de língua espanhola e portuguesa, todos falsamente atribuídos a São Cipriano de Antioquia que viveu no século III d. C.

A versão aqui mencionada é mais recente e pode ser vista na Internet, é uma colecção com temas muito variados, parece haver uma versão mais antiga, que é mencionada por um académico por volta de 1500 (Agrippa).



Uma parte conta a história de Cipriano, outra contém receitas de poções e feitiços. A última parte contém uma lista de tesouros no noroeste da Península Ibérica, principalmente da Galiza, mas também parte do norte de Portugal.

Esta lista não é uma coincidência, dado que toda a região sempre teve a reputação de estar cheia de tesouros. Principalmente por três razões :

- as lendas sobre um povo muito antigo, hoje chamado Moiros, não relacionado com os Mouros.

São os construtores dos muitos múmulos, dólmenes e cromlechs da região. Este povo mítico adora ouro, recuperando-o para o forjar. Nas lendas, as antigas ruínas têm, portanto, a reputação de estarem cheias de tesouros.

-Estórias sobre povos que irão "desaparecer" na região ou fugir, deixando para trás riqueza escondida. Último na lista: Romanos, Suevos, Visigodos, Mouros.

-Ouro nos rios do noroeste. Os historiadores romanos explicam que a população local recuperou muito ouro dos rios. Para não mencionar as minas de prata, cobre e ouro em toda a península, mas especialmente no noroeste. No passado, a Península Ibérica era considerada uma espécie de Eldorado.

Esta reputação de riqueza oculta tornar-se-á em breve um problema, todos estarão à procura de tesouros. O fenómeno parece ser muito importante porque alguns municípios da Galiza terão mesmo de proibir o levantamento de pedras. Há também uma história sobre um sítio megalítico destruído com dinamite.

Infelizmente, este "livro mágico" e a sua lista de tesouros irá amplificar o problema. A caça ao tesouro

tornou-se um desporto nacional.
Muitos dólmenes e cromlechs na região foram destruídos em busca de tesouros durante este período.

Isto confirma que a reputação de tesouros escondidos é completamente falsa, desde o tempo em que o homem tem procurado.

Esta lista é deliberadamente muito enigmática, nenhuma delas parece referir-se ao Mezio ou à montanha, mas uma passagem mencionará a princesa Urraca.

"Na Saboadella, muito baixo, em uma mina com duas lapas de marmore branco, esta o ter rico da princeza Urraca".

O verdadeiro tesouro do Outeiro Maior não é ouro mas é pedra.

Se o rio Lima parece atrair lendas, a montanha atrai ruínas.


Ruínas megalíticas no pé da montanha, os vestígios arqueológicos de um campo militar romano no topo.
Nas encostas, brandas em ruínas, campos de pedra para pastores e gado. Utilizados durante séculos, estão lentamente a desaparecer na natureza.

Sem esquecer a lenda sobre um palácio no cimo da montanha.


Para a era cristã existem outros mistérios, tais como a enorme influência da ordem dos Templários em Portugal, durante a invasão mourisca.

E mesmo na região, onde controlariam uma igreja e terra durante algum tempo, quando normalmente o seu território está muito mais a sul.

Há também indicações de que, com a ajuda do rei, parte da ordem dos Templários sobreviveu em Portugal.


Outro mistério da região, que ainda estou a estudar, é a incrível reputação nacional dos caçadores das montanhas do Soajo no início da Idade Média, uma reputação ligada a um cão único, que parece tê-los acompanhado durante muito tempo.



O próximo artigo sobre o contexto histórico da região será dedicado a um rumor muito mais antigo, que parece absurdo hoje em dia mas que curiosamente é muito comentado por historiadores antigos.

O estranho rumor sobre uma colónia vinda da Grécia, no noroeste da Península Ibérica, muito antes da chegada dos romanos.


Modern Chorographia do Reino de Portugal (1875):


"Dizem que a infanta D. Urraca, filha de D. Ordonho n,

rei de Leão, querendo fundar um mosteiro, e promettendo

seu pae que lhe daria para rendimento do mesmo quanto

avistasse do ponto que escolhesse, escolheu o sitio cha-

mado Outeiro Maior, e como d'ahi se avistasse grande

parte de Portugal e Galliza retractou o pae a promessa, e a

infanta, provavelmente despeitada, continuou a percorrer

estas visinhanças com as suas companheiras, que se propu-

nham a religiosas do mesmo mosteiro ; chegando a este si-

tio cançada, lhes disse sentar, e ahi fundou casa e logo de-

pois o mosteiro em Ermêllo, que é sitio baixo, e d'onde

pouco se descobre."


Lendarium.org :


VIANA, António Manuel Couto.


Lendas do Vale do Lima, Valima, Associação de Municípios do Vale do Lima, 2002 :


"Era uma vez um rei chamado Ordonho II, que governava as Astúrias e todos os territórios para o Sul, conquistados aos guerreiros do Islão.


Neles, figurava o Vale do Vez, com as suas altas montanhas e a beleza do seu rio. Tinha uma filha: D. Urraca, princesa piedosa, protectora de igrejas e conventos, devotamente dedicada à divulgação da fé cristã, em que dispendia grande parte das suas riquezas.


Um dia, decidiu fundar um Mosteiro para frades, em lugar sossegado e fecundo, rodeado de vegetação e boas águas, onde vicejasse uma horta e frutificasse um pomar; onde houvesse ermos floridos para meditação, vinhedos e trigais que fornecessem o pão e o vinho para o mistério eucarístico e a sobrevivência da comunidade.


Com o consentimento real, acompanhada das suas aias e alguns soldados protectores, meteu pés a caminho, por montes e vales do seu reino.


Chegada à Serra da Peneda, que lhe prometia larga vista sobre uma paisagem pacífica e alegre, o silêncio e a oração, começou a subi-la, com entusiasmo, parando, ora aqui, ora ali, para ganhar forças e melhor contemplar quanto a rodeava. Uma dessas paragens chama-se, ainda, Bouça das Donas, lembrando o arvoredo onde D. Urraca e as suas aias repousaram, abrigadas do Sol ardente.


Junto à vila do Soajo, onde se aconchegavam algumas casas de pedra e colmo, achou lugar apropriado para edificação do Mosteiro e logo contratou pedreiros para lhe abrir os alicerces.


Contente com o lugar que obedecia às condições desejadas, D. Urraca correu à Corte de seu pai, a participar a D. Ordonho a feliz decisão. Perguntou-lhe a curiosidade do rei:


- E o que se avista dessas alturas?


Respondeu-lhe a princesa:


- Longes e longes. Vêem-se, para o Sul, as torres da Sé de Braga e o imenso casario da antiga cidade. Para o Norte, as Catedrais de Tuy e de Ourense, junto ao rio Minho. Para o Oeste, praias onde vão quebrar-se as ondas bravias do mar. Para Leste, campos e montes sem conta, onde pastam rebanhos e cavalgam guerreiros dos vossos exércitos.


D. Ordonho manteve-se por uns momentos calado, com uma ruga na testa, como quem segue a seriedade de um pensamento. Depois, disse a D. Urraca:


- Minha filha, gostaria bem de satisfazer a tua vontade de servir a Deus, com a construção desse Mosteiro. Mas não posso, para isso, dispender, em tal projecto, metade do meu reino. É demasiadamente grande esse horizonte. Terás que descobrir outro sítio menos amplo para morada dos teus frades.


Triste com esta decisão real, a princesa, todavia, não desistiu do seu intento e resolveu, então, mandar edificar o seu Mosteiro, não no desafogo dos cimos do monte, mas na profundeza do vale, quase oculto pela densidade das brenhas, sempre coberto de sombras, escutando um rio discreto, mirando a solidão do ermo.


E deu-lhe o nome de Mosteiro do Ermelo."



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